Desafio Escrever um Conto Janeiro de 2010 www.portugalparanormal.com Viagem No Tempo por Gawen (Conto Vencedor) Parecia mais uma manhã de Inverno como todas as outras. A chuva caía lá fora, batendo no vidro da janela, num murmúrio longo, lento e triste. O despertador não tocou, ou se tocou não o ouvi. Acordei sobressaltado e confuso. Não estava no meu quarto, estava num qualquer quarto que não me pertencia. Era pequeno, sob a janela estava uma pequena cómoda antiga encostada à parede, em frente ao leito de ferro e ao lado deste havia um espelho, que fazia parte de um lavatório antigo, uma bacia, apoiado num suporte de metal, com uma pequena toalha pendurada e com um jarro meio de água apoiado no fundo. Reparei que em cima da cómoda estava um velho violino. Era esta a mobília do quarto. Olhei-me ao espelho e não me reconheci. Devia ter cerca de 30 anos, cabelo curto, barba por fazer. Estava confuso, começava a ficar assustado, mas por outro lado sentia-me eu, sentia-me em casa, apesar do local me ser completamente desconhecido. Aproximei-me da janela e olhei para a rua. Estava escuro, as nuvens não deixavam o Sol brilhar, apesar de ter parado de chover. Fiquei impressionado com o que vi. A estrada não era de alcatrão como eu esperava e os carros que passavam eram considerados por mim carros de colecção. As pessoas andavam vestidas com roupas antiquadas e fora de moda, quer dizer, para mim estavam fora de moda. Estava perplexo. O que fazia eu ali? Eu devia era estar em minha casa, no meu quarto, na minha vida! Alguém entrava no quarto, virei-me para olhar para a porta e uma mulher de meia idade, abriu a porta e, sem que eu pudesse dizer alguma coisa, disse: - Adormeceste ou quê? Os outros já estão lá fora à tua espera para começarem a tocar, despacha-te! Dito isto, a mulher saiu e fechou a porta atrás de si. Se já estava confuso, agora estava a achar que era louco. À minha espera para tocar? Tocar o quê? Lembrei-me do violino, peguei nele, apesar de nunca sequer ter aprendido a tocar. Pousei-o em cima da cama e vesti umas roupas que estavam ao fundo da cama, deitei um pouco de água na bacia e lavei a cara. Peguei no violino e saí do quarto. Passei por uma espécie de sala de estar, com uns sofás forrados a veludo vermelho, e saí da casa. Na rua, havia um forte cheiro a lenha queimada, havia fumo no ar, que saía das chaminés. À porta da casa, que parecia ser uma espécie de pensão, estavam dois homens, um deles devia ter a minha idade, era alto, magro, usava bigode e tinha uma expressão divertida no rosto, trazia uma flauta na mão, o outro, um pouco mais velho era mais forte, alto e tinha um ar mais sério, tinha um bodhran. Percebi logo o que se passava, eles eram a minha “banda”, agora estava curioso para saber onde é que íamos tocar. Vamos lá rapaz, antes que nos ocupem o lugar! Acenei com a cabeça e segui-os, percorremos diversas ruas, reparei que em algumas delas haviam grupos de pessoas a tocar que nos acenavam. Havia ruas com muita gente, ruas onde pessoas vendiam quinquilharias, apregoando alto e bom som. Outras ruas eram mais desertas e escuras. Passámos perto de uma espécie de jardim, onde estava um engraxador a tratar dos sapatos de algum homem importante. Havia um grupo de músicos que tocavam ali perto, quando passámos também nos acenaram. Percebi que éramos conhecidos por ali, talvez até tocássemos também nalguma rua. As minhas suspeitas confirmaram-se. - É aqui, estamos com sorte, ontem já nos tinham ocupado o lugar! Aqui é bom pois passa muita gente. Preparados? Ambos assentimos com a cabeça e começámos a tocar uma melodia que me era estranhamente familiar. Lembrava-me que gostava muito dela, que já era antiga, mas que nunca a conseguira tocar, e agora ali estava eu a tocá-la, num violino! Não sei por quanto tempo ali ficámos a tocar, nunca cheguei a saber o nome dos meus companheiros de banda, nem da senhora que me fora chamar ao quarto. Acordei com a sensação de ter passado imenso tempo, ainda tinha a música na cabeça, fiquei durante alguns minutos deitado, a reflectir no que me tinha acontecido. Tinha sido tudo muito real, demasiado real para ser apenas um sonho. Relembrei os sons, os cheiros, a melodia. Sim. Tinha sido real, era eu, numa outra vida, numa viagem no tempo. - FIM -