Desafio Escrever um Conto Dezembro de 2010 www.portugalparanormal.com A Luz Misteriosa por Templa (conto vencedor) Pronto, Morri e depois? Não fui muito velho, ainda bem. Se temos de ir, para quê vivermos demasiado tempo encarcerados num corpo que às vezes só nos trás chatices? Ele é as artroses, os bicos de papagaio, a indesejada Alzheimer e coisas assim. O coração às vezes bem poderia ser mais gentil com quem está entrevado numa cadeira de rodas sem poder andar, nem falar, nem ir à casa de banho, nem coisa nenhuma. Parar de vez e sem dor… Cá para mim, se quem ajuda outrem a viver assim é digno de todo o respeito, para quem vive é mais ou menos indigno, quer dizer, não há dignidade nessa vida… Ou, se não for o coração, poderia ser Deus a desatar o nó… A propósito, ainda não O vi cá deste lado!… Será que a minha existência na Terra foi suficientemente decente para  chegar à fala com Ele um dia destes? Duvido!... Sempre ouvi dizer que era tão difícil aceder-lhe! Só através de boas acções… Mas, que me lembre, ou perdi a memória ou não pratiquei as suficientes para isso… Pois, morrer não é assim tão mau para a grande maioria das pessoas ter medo de se passar!... O que mais me custa é ver a minha mulher, os meus filhos e netos a chorarem. E eu aqui, desde que me lavaram com água quente, me vestiram o fato Príncipe de Gales, com que sempre exigi ser aperaltado para a viagem, e me meteram no caixão para o velório. Apetece-me puxar a manga de cada um e dizer-lhes que a morte é pura ilusão. Isto aqui é, sem dúvida alguma, uma outra vida! Apenas não me vêem!... Podem, no entanto, sentir-me, se quiserem… Afinal, estou na memória deles, nas coisas boas que fiz e, sobretudo, no meu amor inquebrantável, mesmo não estando nós no mesmo lado. Fizeram bem em lavar o meu corpo com água quente. Detesto o frio e sempre pedi a Deus que, se tivesse de escolher entre morrer à fome ou ao frio, preferiria mil vezes morrer com a barriga a dar horas. O padre está a rezar a missa de corpo presente. Encomenda a minha alma a Deus e a minha última casa está prestes a ser selada… Mais lágrimas… Mas para quê tantas lágrimas?!... Custam-me sobretudo as dos meus netos. Principalmente quando sei que me vou fartar de brincar com eles, sem limite de tempo ou de espaço, e de lhes pregar partidas, como sempre fiz, até ouvir as suas gargalhadas inocentes. Vai valer bem a pena aquele AVC que assinou a minha guia de marcha para este mundo. E, depois, sempre posso dar a toda a família uma ajuda do lado de cá quando as coisas não andarem bem por lá… Aquele empurrão para a felicidade… Lá estou eu a caminho do cemitério, no carro preto da funerária, com mil e uma flores por cima do caixão. Das duas uma: ou eu sou boa pessoa para ter tanta gente no funeral ou, então, só por bater a caçoleta já me transformei num anjo merecedor daquele ramo de orquídeas aos pés da urna, entre muitos outros, ao lado coroa de rosas brancas da minha querida mulher. Isto é o que está do lado de lá, se é que devemos falar em lados. Mas, antes de ir coabitar com os meus recepcionistas no outro mundo, vou experimentar o frio e as minhocas debaixo da terra. Que horror! Não é por causa dos bichinhos, a banquetearem-se de mim como se eu fosse o belíssimo peru assado que costumava comer por esta altura, no Natal, mas sim por causa do frio! Por que não optei eu, em devido tempo, pela cremação? Quando fiz “testamento” das minhas últimas vontades devo ter imaginado aquela temperatura dos fornos e as labaredas como o fogo do inferno. Daí, talvez, ter pensado em cumprir a tradição e fazer as delícias das minhocas. O bom disto tudo é que não me dói nada, estou ágil como um gamo e o melhor é sair daqui o quanto antes. Sinto-me a sufocar com tantos quilos de terra em cima. Tenho pelo menos duas opções: ou vou direitinho ter com os velhotes e com a tia Esperança, que já me deram as boas-vindas à chegada à Quinta Dimensão, no túnel que separa dois mundos, ou então vou revisitar os meus lugares preferidos enquanto fui de carne e osso. Sim, é mesmo isto que vou fazer. Preocupado com as lágrimas da família, sobretudo com a Ritinha, a minha neta mais velha, não fiz bem o inventário e preciso ainda de acertar umas contas finais. Também tenho de dar pelo menos um recado… Além de que ainda não me movimento ainda muito bem aqui na Quinta, apesar de os cicerones serem pessoas que nunca deixei nem deixarei de amar, os meus queridos pais e a tia preferida. Mas agora vou para casa. Vou ver se consigo secar as lágrimas à minha mulher, o meu amor da vida e  morte. Somos almas gémeas e suponho que não irei estar por aqui muito tempo sem a minha Rosa Maria, a minha querida flor da eternidade… Pronto, já estou em casa. As viagens aqui são mesmo rápidas. É dito e feito! Mas, estando eu na Quinta Dimensão, deveria saber que a casa estaria vazia. A Rosinha ficou no apartamento do Ricardo, o nosso filho mais novo, e estão todos a secar simultaneamente as lágrimas. Deve ser a falta de prática no trato das coisas aqui deste lado não saber ainda antecipadamente o que vai acontecer!... Tontos, julgam que me perderam para sempre e não conseguem perceber que aqui o sempre é nunca. Não vou perturbá-los. Além disso, também me vai saber bem percorrer os cantos à casa, folhear os livros da biblioteca e, embora vazia, também vou gostar de me deitar na cama, no meu quarto do oratório, onde estão a imagem de Cristo crucificado, os Anjos Gabriel e Rafael, bem como a Fada Cerise, permanente alumiados por uma luz bruxuleante como um farol. Era assim que eu a sentia, um guia na escuridão, que me impedia de tropeçar quando, para não acordar a Rosinha, me levantava nas noites de insónia e ia ler um livro para a biblioteca, onde o nosso gato de longo pelo branco, o Milk, me fazia companhia. Não posso acreditar, é tudo igual!.. Estou deitado na cama, quentinho,  e quem diz que os fantasmas são frios é porque nunca teve o privilégio de conhecer um fantasma bom. Sós os maus fantasmas é que devem ser gelados… Talvez veja Deus, um dia…  O Milk  já se apercebeu da minha presença. A miar baixinho, quase como num sussurro, sobe as escadas e vem ter comigo. Leio-lhe os pensamentos. Tem saudades minhas e convida-me a descer à Biblioteca. Quer dormir no cesto de verga, aconchegado pela mantinha aos quadrados que a Rosinha comprou um dia numa loja de animais no Porto quando ele veio branquinho e pequenino para cá. Por isso lhe pusemos o nome de Milk.  Não me apetece sair da cama. O gato continua a ronronar sem medo. Não sei qual será o meu aspecto de fantasma, mas não devo ser nada assustador. Não tenho outro remédio senão descer com ele. Não quero estar aqui com o Milk às escuras, sentado na minha cadeira de baloiço. Por isso, vou fazer a minha primeira habilidade de fantasma, acender a luz e tirar o meu livro preferido da estante, Um Anjo Chamou por mim. Já folhei umas páginas e li algumas histórias balouçando-me na cadeira,  enquanto o Milk dorme serenamente. Se a Rosinha entrasse agora não mais duvidaria da existência do Além. Se não me visse, pelo menos não poderia ignorar os movimentos da cadeira e deveria pensar logo em mim por me ter visto tantas fazes a fazer o mesmo. Vou escrever-lhe um bilhete. Depois vou deixá-lo sobre o livro, na mesa de vidro, ao lado da vela vermelha, um presente de Natal da Dona Filomena, a vizinha do lado. Ela deve saber instintivamente que estive cá, pois nunca deixa nada fora do sítio. Muito menos o meu livro preferido. Ou será que não pensa na faculdade que os fantasmas têm de andar por todo o lado?!.. Espero não a assustar e talvez amanhã, antes de ela chegar, acenda a vela como se estivesse a fazer um ritual de amor… Querida: Atrás do fogão, num saco de plástico, estão dez mil euros... Era para irmos juntos ao Tibet, como sempre sonhámos…Era uma surpresa… Vai com a Rita, eu estarei lá convosco…És a minha luz…          Feliz Natal Teu para sempre João 16 de Dezembro de 2010. O primeiro recado está dado. Viro o bilhete ao contrário. Não quero que a empregada, daqui por um bocado, ao amanhecer, quando vier fazer a limpeza, o veja. Gostava de ir dormir, mas isso é um problema porque os fantasmas não dormem. O Milk continua feliz da vida, aos pés do dono, enquanto eu fumo o meu cachimbo, um hábito que cultivei ao longo dos anos. Ía sempre uma cachimbada depois do almoço, com a Rosinha a alertar-me para os malefícios do tabaco. O odor do tabaco será mais um sinal da minha presença, nós que um dia jurámos nunca nos abandonarmos. Vou dar uma volta por aí, mas não quero enfiar-me de novo no ambiente das lágrimas, em casa dos meus filhos e dos meus netos. Por um bocado, não quero estar triste. E este passeio vai saber-me tão bem como se fosse a um pub beber um copo e falar com os amigos de longa data, embora também não me apeteça estar com eles pelas mesmas razões. Na primeira noite de morto quero tranquilidade. A rua, com as iluminações de Natal, está deserta e posso andar por aqui à vontade. Este ano, devido à crise, pouparam nas luzes mas, mesmo assim está bonita. Ao meu lado caminha, misteriosamente, uma luz, como se fosse empunhada por uma mão invisível. Não é ela que me segue, sou eu que a sigo. Atrai-me como  um íman, neste ir não sei para onde. Já caminhei ao longo de um quarteirão de casas, sorvendo o ar fresco da noite, tão diferente daquele debaixo da terra onde espetaram com o meu caixão. Ainda bem que esta luz me alumia… Agora apagou-se, pareceu-me, por estar no interior de uma casa, cujas paredes opacas vazou de um lado ao outro. Oh!, Meus Deus, passa-se algo no interior da casa cinzenta, o nº 808. Vou transpor, pelo mesmo processo da luz, a porta fechada da residência e avaliar a situação. Uma rapariga de 15 anos, depois de descobrir que está grávida, ingeriu há pouco 60 comprimidos, uma caixa inteira de soporíferos e a luz desapareceu daqui. Tenho de me desenvencilhar sozinho, aqui no quarto dela. Mesmo não sendo a morte nada de mais, tenho de evitar duas. Com os olhos revirados, a jovem entra em estertor. Vou ter com os pais, que dormem. A mãe já começou a ficar mais agitada, depois de eu lhe sussurrar ao ouvido que a filha está grávida e que está prestes a ficar sem ela e o neto, um rapazinho maravilhoso com uns olhos verdes imensos como os da mãe. A seguir, digo-lhe para seguir a luz brilhante e misteriosa que, inesperadamente, voltou, estando a gora a meu lado. Peço-lhe para sentir as coisas com amor e deixar-se de preconceitos, os mesmo que levaram a pobre rapariga ao suicídio, consumado se não fosse a minha intervenção e a de não sem mais quem que anda por aqui disfarçado a alumiar-me. A mulher levanta-se de rompante, irrompe pela casa onde eu, um fantasma recente, acabei de acender as luzes, incluindo as da árvore de Natal. Dirige-se ao quarto da jovem, depois do pesadelo que a obriguei a viver. - Paula!, Oh!, Meu Deus, o que aconteceu? Já tem a filha nos braços, enquanto grita pelo marido e lhe ordena que chame a ambulância. Não tenho nada a fazer aqui. Agora é com os médicos e com Deus. Onde é que se meteu a minha candeia, que estou outra vez às escuras?!... Este meu primeiro dia de finado está a revelar-se muito movimentado. Mas ainda bem que saí de casa, para onde não sei se deva voltar. O gato continua tranquilo, sinto, pela hora terrena são 5h45 da manhã, embora isso a mim não me faça diferença nenhuma porque, aqui neste lado, nem sequer há relógios de sol. Medir o tempo é supérfluo. Sim, vou para casa, regressar à cadeira de balouço e esperar que a Rosinha chegue, lá pelas duas da tarde. Estranho, já passaram uma data de horas e não tenho raça de fome, nem frio. O Além é dotado de uma grande economia. Não precisamos de comer, nem de andar em nenhum transporte. Aqui não há crise e tudo é fácil. Ou sou eu que ainda não estou entrosado nos hábitos da Quinta Dimensão?!... Também não necessitamos de dinheiro. Ah!, a Rosinha vai ficar mesmo contente com os dez mil euros que, se não fosse o meu bilhete, nunca descobriria. E o trabalhão que eu tenho tido para afastar a mulher-a-dias da biblioteca, a fim de ela não ver a minha declaração de amor e descobrir o pequeno banco em que transformei as traseiras do fogão, colocado em triângulo ao canto da cozinha!... São duas horas da tarde, a Rosinha está a chegar. É altura de acender a vela. Mas não vou ser eu. Vou instruir mentalmente a rapariga para o fazer, com a desculpa de que a sala tem um cheiro a cachimbo demasiado entranhado. É o que ela irá dizer quando a minha querida mulher a questionar sobre a vela acesa. Também não vou pôr-me aqui a abanar a cadeira, não quero assustar nenhuma das duas. Influencio a minha mulher a entrar sozinha na biblioteca e murmuro-lhe ao ouvido que a amo. Já virei o bilhete com as letras para cima. Lê-o e uma lágrima rola pela cara dela. Nada que eu não suporte, depois das lágrimas de ontem. Questiona-se quando o terei escrito e vê a data, 16 de Dezembro, o dia do meu funeral. A tonta, em vez de ver com os olhos da alma este ritual todo, está a imaginar que eu já sabia o dia da minha última viagem e escrevi o bilhete com uma data futura coincidente com o meu enterro. Eu que nunca fui de pressentimentos!... Foi o AVC que me escolheu a mim e não eu que escolhi o AVC. Se calhar,  porque tenho alguma missão importante na Quinta Dimensão. A seguir, sorri de agradecimento pela surpresa do dinheiro. Chama-me maluco e abraça-se ao meu casaco, ainda pendurado no bengaleiro. Tem saudades minhas… Apetece-me beijá-la e dizer-lhe, de uma vez por todas, que a morte não existe, quando, afinal, até escrevi o bilhete esta madrugada com o Milk aos meus pés a ronronar e depois de reler algumas passagens do meu livro preferido. A Rosinha acaba de apagar a vela como se nada fosse. Decididamente, não acredita que estou aqui. Mas não vou desistir. Acabarei por me fazer notar. Por agora vou ter com os meus velhotes. Eles já devem estar em cuidados. Mais uma viagem tipo relâmpago. Os meus pais vêm, de novo, ter comigo ao túnel interdimensões. Levam-me de imediato conhecer o lugar onde estão, juntos como quando tinham corpo. Se encarnados, tal como eu e a Rosinha, eram unha e carne, desencarnados são como um só. Trabalham na Escola de Almas, na 22ª Secção da Depuração do Egoísmo e, neste momento, preparam um contingente de 500 que vão encarnar nos cinco continentes do Planeta Terra. O meu pai, o velho Júlio, diz-me que recebeu um recado para eu ir rapidamente à Direcção, a fim de tomar conhecimento de um assunto importante. Não sei com quem vou falar, mas o melhor é não fazer suposições e subir. Aqui, como em todo lado, as direcções são sempre nos últimos andares. Ainda bem que os fantasmas não precisam de subir escadas. Dois anjos apresentam-se. São os secretários do Ministério da Solidariedade, Gabriel e Rafael, e dizem-me que o chefe quer falar directamente comigo, porque quer ser ele a dar-me a nota final acerca do meu desempenho na Terra. Mandam-me entrar para um jardim cheio de flores e esperar. Não resisto e colho uma rosa, lembrando-me da minha flor mais querida. Aguardo com alguma surpresa. O Jardim abre-se suavemente para uma grande abóbada azul celeste e um foco brilhante de luz incide sobre mim, iluminando-me de alto a baixo. Sinto-me em êxtase, embora não veja nada a não ser aquela imensa e misteriosa luz. Ai esta voz!... - Sabes quem sou, João? - Talvez Deus!...  Como ninguém viu Deus e eu não vejo aqui ninguém, talvez sejas mesmo Deus, o eterno desconhecido… - Estás enganado João. Eu estou sempre onde haja uma centelha de Amor. Entre Deus e o Amor não há diferença nenhuma. Mas não é para falar de mim que te chamei. Estás aqui para saberes rigorosamente o porquê e o dia em que ganhaste um lugar no céu… - Foi talvez por causa minha intervenção de hoje no caso da rapariga suicida!... - Não, não foi…Nessa situação já tu estavas do lado de cá, com todas as faculdades de um fantasma activas… E, quem pensas que era aquela luz que te levou ao nº 808?... - Ah!, bem me queria parecer que eu sozinho não conseguiria fazer aquilo. Obrigado pela ajuda… - Não tens de quê. Mas vamos lá ao assunto. Lembras-te daquela noite em que, tinhas tu 20 anos, desgostoso da vida, sem uma namorada, longe da família e a passar privações, tiveste um encontro inesperado à saída da porta? - Ó, sim, Deus! Lembro-me perfeitamente. Eram 22 horas. Só tinha 5 euros no bolso, ou o equivalente a isso em escudos, e ia comprar tabaco com eles quando vi um velhote sentado no degrau do prédio… pareceu-me tão desamparado!... - E o que fizeste então?!... - Falei com ele… Era das redondezas, tinha ido à cidade e perdera-se… Entretanto, anoitecera e, não conseguiu regressar a casa. Nem dinheiro tinha para pagar o transporte…Dei-lhe o meu último dinheiro para ir de táxi… Sempre ouvi dizer que é feio um homem chorar, mas, nessa noite, no silêncio do meu quarto, chorei como um desalmado… Eu sentia-me infeliz, mas percebi que havia pessoas que o eram muito mais… - Estás a ver João? Para aquele pobre homem, tu foste uma luz, um guia na escuridão.  Olha fizeste o meu papel, foste Deus!... É certo que, entre outras coisas boas, também te fartaste de fazer disparates!... Até encontrares a Rosa Maria, a tua alma gémea! Mas naquela noite abriste-te ao Amor com como nunca o tinhas feito. Isso foi logo registado na tua folha de serviço e aqui estás!… Estou bastante comovido, estou quase a chorar outra vez. Tenho de disfarçar… Deus irradia uma luz misteriosa, sinto-me um privilegiado por estar na Sua presença. - Há muito que fazer aqui no céu? Os meus pais trabalham na Escola de Almas, numa das secções da Depuração do Egoísmo. Será que posso ficar lá enquanto não tenho a Rosinha a meu lado? - Para já não!... Tens permissão para ir para casa durante três meses, até à tua cadeira de balouço… Deus acaba de esboçar um sorriso… - Depois vais regressar com novidades… Mas isso saberás depois. Agora sai, por favor. A minha vida é muito ocupada… Pois deve ser!... – digo com os meus botões. Estou outra vez à porta com os dois anjos. Dão-me os parabéns e, depois de dizer um até breve à Tia Esperança e à Mamã Isabel e ao Papá Júlio, regresso rapidamente a casa com a rosa branca na mão. São 22 horas, a Rosinha vai deitar-se e vou colocar a rosa sobre a cama do lado dela. Se desta vez não perceber que sou eu estou bem aviado. Talvez, se pudesse usar legitimamente uma luz brilhante igual à que me conduziu a casa da Paula, consiga despertar-lhe a atenção. Se fui um pouco Ele quando socorri o velhote, talvez possa usar a mesma técnica de Deus, a misteriosa luz divina. Já não me lembro se a vi quando socorri o pobre homem pelas mesmas 22 horas daquela outra noite há tantos anos atrás, quando comprei o céu por cinco euros. A Rosinha acaba de ver a flor e acha estranho... Ainda se questiona sobre o meu bilhete e desta vez está mais sensitiva… Nunca tendo deixado de pensar em mim, pela primeira vez, coloca a hipótese de eu estar ali com ela em espírito… Já deitada, diz-me de novo que tem saudades minhas e beijo-lhe os cabelos prateados, enquanto ela formula o desejo de me ver em sonhos. Vou fazer-lhe a vontade… São 5h45 da manhã, o Milk subiu ao quarto ronronando-lhe aos pés, naquela dança doce de gato carinhoso, A Rosinha, já bem acordada, pega-lhe ao colo e afaga-o, dizendo-lhe com um sorriso: - Sonhei que uma luz misteriosa e brilhante me viria buscar em breve…Acho que era o teu antigo dono e como, dentro de três meses, me vou encontrar com ele, vais amanhã para casa da Ritinha. Ficarás lá, até ambas voltarmos do Tibet. Aliás, ficarás para sempre com ela... Até nos encontrarmos na Quinta Dimensão… Pronto, Estou mesmo feliz! A Rosinha está com pena de não poder trazer a cestinha do gato. Mas não faz mal. O céu não é um lugar frio nem escuro. Aqui a luz misteriosa de Deus alumia-nos, encurtando o caminho que conduz à felicidade.  - FIM -