Desafio Escrever um Conto Dezembro de 2010 www.portugalparanormal.com A Luz Misteriosa por AlexSynchro Era noite cerrada de um dia que tinha sido comprido demais para Semreh, problemas no trabalho, problemas com os pais, problemas com a mulher, enfim uma panóplia de situações que estavam a desequilibrar a sua vertente espiritual. Decidiu ir passar a noite a um hotel na baixa de Lisboa. Era um hotel pobre, mas era o suficiente para passar a noite e tentar no fundo, reencontrar-se novamente. Como sempre, começou a preparar o trabalho do dia seguinte no seu portátil, alinhavou todos os textos e todos os argumentos para apresentar ao novo director da empresa. Era uma empresa de novas tecnologias, dedicava-se principalmente ao desenvolvimento de nano-componentes para equipamento laboratorial. Eram já duas e meia da manhã, quando deu por finalizada a preparação, tomou um duche e tentou meditar. Concentrou-se, respirou fundo uma série de vezes, mas estava demasiado agitado para que a concentração desse os frutos desejados. Tentou novamente, esvaziou a mente, pensou no “nada”, mas não conseguiu. Estava frustrado com o que todos os problemas lhe estavam a trazer. - Há uns anos, isto não aconteceria. Sinto-me perdido. Disse Semreh para ele próprio, enquanto se levantava e esvaziava a sua mala do portátil, colocando tudo em cima da secretária. Ia fazer uma revisão ao que tinha preparado. A pouca confiança nele próprio estava sem dúvida a contribuir para um piorar contínuo do seu estado de espiríto. Fez uns apontamentos à mão, acrescentou uns pareceres no argumento do documento word, documento esse que era talvez o que de mais importante tinha naquele momento. Daquele documento dependia “o ganhar pontos” perante o novo director. Olhou para o relógio e disse alto: - Vou dormir menos de cinco horas... E é se dormir... Voltou a colocar tudo dentro da pasta e nem sequer voltou a tentar meditar, estava demasiado desconcentrado. Já tinham passado uns dez minutos e tinha dado duas voltas na cama, sem conseguir sequer um bocejo. Então, abriu os olhos para ver as horas no rádio da mesa de cabeceira. Três horas e três minutos da manhã marcava o relógio. Começa a reparar então, numa luz que estava a iluminar a secretária. - Eu desliguei o computador! Que luz é aquela? Disse, enquanto se destapava e se levantava para ir ver o que era aquele estranho brilho. Chegou perto da secretária e viu então que se tinha esquecido de guardar a caneta, a caneta que guardara religiosamente após a morte do melhor professor que tinha alguma vez conhecido. Era uma luz ténue, mas brilhante e mais brilhante ficou quando pegou na caneta e carregou na mola. Surgiu então um intenso cheiro a rosas, que encheu todo o quarto. Semreh não se assustou, ele estava habituado a experiências transcendentais. Ainda com a caneta na mão, sentou-se na cama e sentiu um arrepio e ouviu um zumbido. Era deveras uma experiência estranha e entusiasmante, nunca todos os sentidos tinham sentido toda aquela intensidade. Em pouco tempo o quarto aqueceu exponencialmente, Semreh suava como se estivesse a correr há uma hora, mas estava completamente imóvel, sentado na cama enquanto observava o brilho que aumentava quanto mais ele se concentrava naquela luz misteriosa. Sentiu então uma sensação nova, tonturas que se tornaram insuportáveis ao ponto de tombar para o lado e sentir-se envolvido numa espiral que subia desde os pés até ao topo da cabeça. Semreh já não estava no quarto, perdeu o sentido de gravidade, não sabendo se descia se se elevava naquela espiral que se tornara visível ao ponto não conseguir distinguir cores ou formas. - Que cheiro é este? Onde estou? A sua voz ecoava mas não haviam paredes, estava rodeado de um diferente tipo de matéria que pulsava odores e sons que se entranhavam no seu corpo. A luz que emanava de todas as direcções era a coisa mais bela que vira em toda a sua existência. Estava completamente extasiado e quando tentou andar, sentiu que flutuava naquela estranha matéria. Ouviu então uma voz, como se a voz viesse de dentro e não de fora! Ao princípio imperceptível, tornou-se clara e doce com o aproximar dum vulto, notou então que estava a começar a distinguir formas e cores, sentiu-se tonto novamente e tentou baixar-se de forma a sentir uma base para se sentar e ouviu então a primeira frase completa: - Aqui não há dor! - Aqui não há medo! Semreh, incrédulo, responde o que lhe vem à cabeça naquele momento tão estranho e ao mesmo tempo tão único e belo: - Mas, mas... Quem és tu? Quem és? - Não me conheces? Responde o vulto que já não é mais um vulto, mas sim um velho conhecido de Semreh... - Profe... Professor H. Thot! É você?!? Mas como?! - Sim, sou eu mesmo! Tu pediste ajuda e eu vim... Foste o meu melhor aluno de sempre e eu devo-te isto! E antes de perguntares, não, não estás a imaginar e sim, estamos dentro da tua mente! E assim, em menos de nada e após as palavras do seu professor, sente paz e harmonia! Ainda sem saber como poderia estar “dentro da própria mente” a falar com o professor H. Thot, que estava morto há mais de dez anos. Antes de formular uma pergunta que fosse, o professor como que se estivesse a ler a sua mente, começa o discurso que Semreh ansiava ouvir: - Passaram mais de dez anos e no entanto, continuas a precisar de alguém que te guie, continuas a precisar duma pessoa que te mostre o caminho embora sejas mais do que capaz de o fazer também... Fazes as perguntas erradas nos momentos certos! Agora perguntar-te-ás se é tudo fruto da tua imaginação, todas as mensagens que o Cosmos te envia e tu decides ignorar, se tudo isso que vês e sentes é apenas fruto da confusão que enche a tua mente. Eu sei que fazes essas perguntas a toda a hora e a tua capacidade de meditação piora a cada dia, a tua relação com as pessoas mais importantes da tua vida deteriora-se a cada dia. Porque achas que isso acontece? Eu respondo-te, porque colocaste os interesses materiais acima dos espirituais! Inverteste a espiral do conhecimento sem sequer dar conta! Tens que procurar no teu interior e ver qual o evento que provocou essa inversão! Só assim voltarás ao Caminho! Nunca te esqueças que o Universo é uno contigo e tudo o que há! O diálogo já durava há horas, as suas palavras transformavam-se em energia brilhante, como se fossem raios que não desvaneciam, mas que perduravam e penetravam em Semreh. Quando Semreh fazia perguntas, o seu professor respondia com uma precisão incrível, como se soubesse o que lhe iria ser perguntado... - Terei tempo de alterar o que há para alterar? Voltarei a ser o que já fui? Perguntou Semreh, num semblante muito mais calmo e lúcido. - Claro que sim, porque o tempo não existe, onde estou não há tempo, eu vejo o passado, o presente e o futuro a acontecerem ao mesmo tempo. A palavra tempo é uma invenção do homem... Apenas existe aquilo que no plano terreno, vocês chamam: Lei Causa/Efeito... Todo o Universo é assim e tudo o que há no Universo é assim. Só que enquanto seres viventes, não vislumbramos isso com exactidão. Preferimos ver televisão! E ao mesmo tempo que esta resposta é formulada, H. Thot, como se estivesse a apagar uma vela, sopra na direcção de Semreh, provocando a mesma sensação que tinha sentido na cama do hotel; uma espiral que desta vez descia em direcção aos pés... Semreh, abre de novo os olhos e está já deitado na cama do hotel, completamente assombrado com o que lhe aconteceu e mais ficou quando olhou para o relógio da mesa de cabeceira. Eram três horas e três minutos! - Mas, mas! Mas como? Eu estive com o prof. horas a fio, como é possível? Semreh agarra no telefone e liga para a recepção do hotel! - Recepção, muito boa noite! Ouve-se do outro lado do telefone! - Que horas são? Pergunta Semreh com uma voz completamente alucinada! - São três horas e quatro minutos; posso ajudá-lo em mais alguma coisa? Responde o recepcionista, ao mesmo tempo que Semreh desliga o telefone e se deita de novo na cama, respirando de forma ofegante, como se fosse vítima de uma perseguição. Levanta-se rapidamente e prepara-se para tomar um banho novamente! Já na casa-de-banho, olha-se ao espelho e fica completamente pasmado com o que vê, uma queimadura no peito com um formato que lhe é bem conhecido, uma espiral Kundalini exactamente no Chakra do Plexo Solar! - Não, isto é demais! Que me está a acontecer?? Será que ainda estou a sonhar? Será que sonhei que estava a sonhar com o professor e vou acordar em breve? Semreh, dialoga consigo mesmo instintivamente enquanto se mete na banheira e toma um banho! Seca-se, veste-se, arruma as coisas e sai do quarto do hotel. Dirige-se à recepção e quando se aproxima da pessoa que está atrás do balcão, vê uma nuvem de energia que a envolve como se fosse a sua aura. Pede a conta, paga e sai definitivamente do hotel, entra num táxi e dá a sua morada de casa! Semreh repara que o taxista está envolto na mesma matéria que o recepcionista e pensa para si mesmo: - Esta é sem dúvida a maior experiência metafísica da minha vida! Nunca antes sentira tanta conexão com o Universo e comigo mesmo. Já percebi a mensagem e lembro-me exactamente de tudo o que aconteceu e me levou a entrar nesta espiral negativa. Está nas minhas mãos inverter este ciclo. Eu sei como, eu quero e escolho mudar... Hoje! Vou mudar o meu Universo e esperar que as energias dessa mudança se espalhem às pessoas que me rodeiam e também elas mudem! Chegou a casa e nem arrumou as coisas, entrou no quarto e viu que a sua mulher emanava a mesma energia que as pessoas anteriores, deitou-se ao lado da mulher e disse-lhe ao ouvido enquanto ela dormia: - És tu! Deitou-se e dormiu cerca de duas horas que ao acordar pareceram mais do que suficientes para descansar bem. Aliás, há algum tempo que não dormia tão bem! Finalmente Semreh, conseguiu ver dentro dele próprio o que estava mal, conseguiu ver que tudo o que fazia tinha uma reacção na mesma medida da acção. Antes de sair de casa, disse à sua mulher que logo à noite iriam ter aquela conversa já tantas vezes adiada. Ela sorriu e concordou! Seguiu para o trabalho, chegou antes de todos, ao abrir a sua pasta viu a caneta do seu professor e colocou-a em cima da secretária, retirou também os apontamentos e o portátil e sentiu então um calor tremendo, viu a caneta a brilhar novamente, a erguer-se e a escrever numa folha: - É isso! Semreh sentou-se e sentiu que tudo ia correr bem! Sempre que se lembrasse do seu verdadeiro lugar no Universo, nada o faria desviar do seu caminho novamente. - FIM -