Desafio Escrever um Conto Abril de 2010 www.portugalparanormal.com Invasão Extra-Terrestre (Conto Vencedor) por Templa Era o início do dia 1 de Abril de 2010. Jonh Silva apresentava na televisão o último noticiário da noite, desde New Bedford, uma cidade piscatória algo decadente depois de o bacalhau da Terra Nova, que a fizera prosperar durante mais de um século, ter sido dizimado por uma pesca sem controlo. A Nasa lançara mais um Vaivém Espacial ultra sofisticado, com a missão especial de detectar vida na galáxia e tendo ainda como mira o novo planeta Superter recentemente descoberto, sobre o qual havia boas razões para pensar que poderia ser habitado. Assunto do dia anterior tinha sido também a descoberta no Louvre, em Paris, escondido na pirâmide, de um estranho indivíduo transparente como cristal, com forma órgãos internos idênticos aos humanos, mas com a particularidade de não possuir quaisquer orifícios no corpo. A não ser uns grandes olhos semelhantes aos dos homens. As notícias eram ainda escassas, depois de o governo francês ter decretado sigilo absoluto, enquanto os cientistas procuravam determinar a origem da criatura e uma maneira de comunicar com ela. Já se especulava que era através da pele, onde não havia um único pêlo, que o “homenzinho” se fazia entender. Alguns cientistas, pelas características do espécime, com a total a ausência de orifícios, à excepção dos olhos, diziam que seriam um homem do futuro e que aquela forma se deveria ao facto de a Terra se ter tornado num planeta onde quase já era impossível respirar, comer e até procriar. Tudo graças aos hábitos civilizacionais do homem, que a tinham colocado na rota da destruição. O exemplo era o bacalhau da Terra Nova, e Jonh, após o longo noticiário em que falara também de um massacre numa escola do Kansas, feito por um miúdo de treze anos, saldando-se tudo na morte de seis adolescentes a tiros de metralhadora, preparava-se para acabar. Fazia o remate final no noticiário, ao referir uma outra cidade, desta vez portuguesa, na região de Aveiro, de onde a sua família era originária e que, depois de ter sofrido os mesmos males de New Beresford, no Massachusetts, se virara para o turismo. Após os velhos pesqueiros terem morrido na doca marítima, mais parecida com um cemitério fantasmagórico, Aveiro, com os seus barcos moliceiros coloridos recuperados, aproveitando as potencialidades da bela ria que a tornava semelhante a Veneza, virara-se para o turismo e esquecera o moliço do fundo da ria, apanhado outrora para fertilizar os campos. Seria então o fecho da emissão e logo Jonh iria para casa, após percorrer o espaço de alguns quilómetros entre o estúdio e a sua residência, em Fairhavens. Fora mais ou menos proibido de falar muito no “homem” do Louvre, segundo o seu director de informação, para não preocupar os americanos, incapazes de distinguir uma mentira de 1 de Abril de um tema sério, dos muitos relatados no último telejornal da noite. Além de que mediava, entre a Europa e os Estados Unidos, a diferença horária de alguns fusos e os compatriotas não se lembrariam disso para descodificar o engano desencadeado em Paris umas horas mais cedo. Por outro lado, não fora a primeira vez que alguém se lembrara de lançar no ar algo tão estapafúrdio como o homem de cristal. Tinha sido o caso de “ A Guerra dos Mundos”, relatada na rádio em 1938 por Orson Wells que, inspirado na obra homónima de George Wells, quase levara a América ao suicídio colectivo... Era cerca da meia-noite e vinte quando o estúdio começou a tremer, os móveis e as secretárias ameaçavam cair, arrastando os papéis por onde acabara de noticiar pela última vez os factos importantes do dia, agora já véspera. Jonh pensou tratar-se de um de um forte tremor de terra. Preparava-se para dar em primeira-mão a notícia aos telespectadores quando o telemóvel de última geração vibrou, ainda a emissão estava no ar. Era a mulher, Susan. Com a atrapalhação, Jonh atendeu. - Jonh!- gritou ela, transtornada - Onde estás? A cidade está invadida por criaturas estranhas e uma está no nosso quintal pronto a entrar em casa! Vem depressa! Não sei o que fazer, os miúdos estão radiantes à entrada e parecem estar a dar-se bem com a criatura!... Atarantado, Jonh esperava toda e qualquer coisa menos aquilo, que a auto-estrada sobre o Rio Acushnet tivesse ruído, que a casa estivesse a arder, toda e qualquer desgraça. Aquela não e foi em pânico que perguntou, igualmente aos gritos: - Mas eles estão a fazer o quê? Vai já buscá-los e mete-os dentro de casa, enquanto não chego. Como é que é a tal criatura? - Não sei! Parece de cristal e irradia luz por todo o lado! É transparente, mas eu ainda só o vi da janela enquanto os miúdos se esgueiraram para o jardim e foram ter com ele, ou sei lá o quê! - Mas tu disseste que a cidade tinha sido invadida, como é que pode ser isso? – Perguntou Jonh, entre o incrédulo e o perplexo. - Há por todo o lado uma luminosidade estranha que ofusca a iluminação! Parece uma trovoada de relâmpagos estranhamente silenciosos. - Mas não há ruídos nenhuns? Como é que foram alertados para isso? - Inicialmente sim, parecia um tremor de terra! Mas anda depressa! Estás aí a fazer perguntas e eu aqui numa angústia terrível! Não sei se voltarei a ver os nossos filhos! Podem ser raptados e tu com essa calma toda! - Está bem. Vou já para aí. Vai buscar os miúdos – ordenou. Enquanto desligava, Jonh pensou se não seria a mulher a pregar-lhe uma mentira de 1 de Abril. Mas, francamente, a brincadeira era forte de mais. Só ficando doida lhe daria para inventar uma patranha daquelas. Devia ser o fascínio dela pela mítica Atlântida, de onde, mais dia menos dia, como a mulher acreditava, uma civilização de extraterrestres tomaria conta do planeta, como diziam as teorias que ela lia avidamente e incutia na cabeça dos dois filhos gémeos, a Bethy e o Bob, desde a altura em que lhes lia histórias para adormecerem. Atabalhoadamente, desceu as escadas do 7º andar, onde estava instalado o estúdio. O elevador, não sabia porquê, tinha avariado e não teve outro remédio senão galgar as escadas duas a duas. Iria ter com Susan e depois iria rir-se com ela ou desancá-la-ia por lhe ter pregado semelhante susto. Já estava arrependido de ter falado no “homem” do Louvre, a patranha francesa que devia ter despoletado na cabeça dos engraçadinhos como a mulher a ideia de semelhante invenção. Os marcianos a invadirem a terra. Era só o que lhe faltava! Já dentro do Mustang de 1952 recuperado, azul e luzido, Jonh, ainda no parque automóvel, ouviu o telemóvel tocar de novo. Desta vez era o Director de Informação, o velho sefardita espanhol Abraão Rocas, que, com os pais, tinha fugido novo da Guerra Civil Espanhola. À queima-roupa, o judeu perguntou-lhe onde estava e Jonh, apesar de tudo preocupado com os acontecimentos, resolveu pregar-lhe uma pequena mentira. Tinha de ir ver o que estava a acontecer com a família. - Estou a estacionar à porta de casa... - À porta de casa, Jonh?!... Se estivesses a chegar não estarias com essa calma toda! Regressa depressa ao estúdio para uma emissão especial. Vê-se mesmo que não deste um único passo na rua!... - Uma emissão especial Rocas?! Mas porquê. Sempre houve um temor de terra, como me pareceu?!... - Um tremor de terra?!... Pior do que isso, pior do que uma guerra atómica!... Fomos invadidos por extraterrestres – respondeu o homem. O mundo está em pânico e receio que, desta vez, a América pouco passa fazer para salvar a humanidade. - Uma invasão de extraterrestres? Não posso crer! – exclamou Jonh, enquanto se lembrava da conversa com Susan. Afinal não era nenhuma partida do dia das mentiras. Estava mesmo a acontecer, Susan e os garotos corriam perigo. - Não posso Rocas! Está um no meu jardim a fazer sabe-se lá o que aos meus filhos!... - E onde pensas ir e como? No Mustang?!... Mal saísses, se te deparasses com um, o carro talvez ficasse bloqueado e a ti acontecia-te o mesmo. Não sei durante quanto tempo mais ainda vai haver energia e telefones. Tanto quando sei, das poucas informações recolhidas, as únicas a quem não acontece nada são mesmo as crianças. Por isso, volta imediatamente para o estúdio e reúne os repórteres. Coloca na rua todo o pessoal e equipamento. Não sei se resultará, mas a nossa obrigação é informar os telespectadores. O tom peremptório do director não admitia réplicas, e Jonh não teve outro remédio senão fazer o percurso inverso e falar com o pessoal de serviço, dois câmara mans e dois repórteres. Informou-os do que se passava, mandando-os de seguida para Fairhavens, a casa dele, onde tinha a certeza de encontrar um desses homens transparentes igual ao do Louvre. À colega Eva Lins, pivot e reportar do Canal NB, Jonh recomendou-lhe que o informasse especialmente acerca da Bethy e do Bob. Se pudesse falar com Susan, devia tentar explicar-lhe como fora vítima do dever e praticamente coagido pelo judeu a não regressar a casa. Saíram a custo. Com o medo estampado no rosto, os homens e a mulher tinham colocado mil e uma objecções. A avaria possível do material, o congestionamento das estradas por naves redondas de material desconhecido e impossíveis de neutralizar. Mas, o pior de tudo, seria um possível rapto, seguido de ablação de órgãos ou colocação de implantes, como narravam as pessoas assumidamente vítimas de manipulação extraterrestre. Sobretudo nos Estados Unidos. Jonh julgava lícito todos os receios, mas não teve outro remédio senão enviar os repórteres para o desconhecido, talvez até para a morte. E, à última hora, num gesto de solidariedade, resolveu entrar na viatura com os colegas e sair do edifício. Quanto mais não fosse, para tomar um primeiro contacto com a realidade, aquilatar-lhe a dimensão e o perigo. Talvez fosse a última experiência da sua vida... A noite, aparentemente, estava serena. Olhando as ruas, havia como habitualmente carros estacionados por todo o lado, embora se notasse a ausência de transeuntes. Não se ouvia um único ruído, nem mesmo no Gingle, o pub perto da NB. Isso assustou-o. A calma parecia uma calma de morte. Se os humanos não estivessem todos mortos, no mínimo estariam já neutralizados pelos invasores sem boca, como a criatura do Louvre. Nem o pio de uma ave nocturna, o latido de um cão, o miar de um gato. Nada. Era um silêncio arrepiante e macabro que os fazia sentir mais pequeninos do que grãos de areia manietados por um vento siberiano e agreste. Os cinco, assustados, olhavam para todo o lado, na esperança de verem milhares de naves, estacionadas por lá, mas não se via nem uma. Se era um ataque do outro mundo, então não deviam pensar que os meios bélicos utilizados fossem idênticos aos do Planeta Terra. Mas como detectar os mísseis ou fosse lá o que fosse naquela calmaria toda? Eve, nem mais nem menos assustado do que os companheiros, levantou os olhos para o céu, quase como quem pede ajuda divina. Nesse instante, notou que havia milhares de pontos minúsculos a pairar por cima dos prédios e das árvores. Brilhavam como pirilampos na noite, entrecruzando focos de luz num gracioso efeito de fogo de artifício, tão silencioso quanto harmonioso. Foi então que, por entre o medo e o fascínio, concluíram, a haver uma invasão, a guerra, a haver guerra, parecia ir tornar-se numa guerra talvez fatal, mas, mesmo assim, bonita. Não tinham andado um quilómetro, quando Jonh resolveu regressar a pé. Não lhes tinha acontecido nada e tinham todos de cumprir a missão como lhes ordenara Rocas. Ele, por seu lado, esperava que tudo continuasse assim, até os companheiros chegarem a Fairhavens. Era de onde, se nada houvesse em contrário, decorreria a primeira transmissão directa, com uma emoção como ele jamais tinha experimentado. Não só porque tudo era novo, mas principalmente pelo facto de os filhos estarem envolvidos numa situação de consequências imprevisíveis. Não sabia por que tinham eles sido escolhidos. Mal chegou ao estúdio, a arfar como um gato depois de subir os lanços de escada até ao sétimo andar, após ter preparado a emissão com a ajuda dos dois seguranças, ligou ao judeu, que lhe perguntou de imediato: - Onde é que andaste e por que desligaste o telemóvel? E a emissão não está já no ar porquê? - E digo o quê Rocas?!...Estive lá fora durante um bocado e a única coisa de estranho que vi foram os pirilampos no céu!...Nunca assisti a uma invasão de extraterrestres mas esta é, no mínimo, estranha! - Vai ao fax. Já tens lá a informação tríada. Dizes que o exército dos Estados Unidos está a controlar o processo, em colaboração com a NASA e com o FBI. Sobretudo, recomenda calma aos americanos. Diz também que o Presidente Obama, dentro de uma hora aproximadamente, irá fazer uma comunicação ao mundo. Presume-se que nas próximas duas ou três horas nada funcionará, nem na Terra, nem no espaço. Tudo quanto seja invenção humana será neutralizado, tanto quanto dizem as televisões. Mas nada se sabe de concreto. Em último caso, coloca imagens da CNN ou da Sky News. Qualquer coisa, liga-me. Se tudo correr bem, estou aí dentro de meia hora. Jonh sintonizou o canal da CNN e ficou embasbacado com as imagens. Atlanta estava literalmente transformada num imenso fogo de artifício e, de onde em onde, quer no ar quer em terra, via-se uma ou outra nave redonda, com luzes vermelhas a piscar, mas sem nada nem ninguém dentro. O repórter estava no Sweetwter Park e viam-se por todo o lado centenas de mulheres grávidas, por cima delas os minúsculos pontos luminosos que Jonh tinha visto em New Bedford. Não sabia o que pensar e o melhor era prestar atenção ao repórter, um homem dos seus 50 anos, e só depois começar o seu próprio trabalho com a reportagem no seu jardim feita pelos colegas em Fairhavens. - Isto é algo sem precedentes na Terra – dizia o repórter - Muito embora desde sempre tenha havido relatos sobre extraterrestres, raras foram as pessoas em todo o mundo a dar-lhe crédito. Mas, hoje, é impossível negar a sua existência. E, pelo que podemos comprovar em todo o lado, sobretudo neste parque, a invasão é uma realidade. Falei há pouco com uma criança e ela disse-me que, tanto ela como todas as outras, em todo o mundo, já se encontram magnetizadas com a energia do Superter, o planeta recentemente descoberto. Enquanto dizia isto, o homem apontava para uma criança, que parecia ter sido eleita o porta-voz em Atlanta de todas as outras crianças. - Não sei se conseguem ver - dizia de novo o repórter - mas nota-se já uma ligeira transparência neste menino, com quem falei há pouco mas que se recusa a falar em directo para as câmaras. Tem 9 anos e, depois da magnetização, parece branco e diáfano. Tudo isso nos leva a pensar estarmos perante uma guerra sim, mas uma guerra santa, de proporções gigantescas e de cujos efeitos não se tem ainda verdadeira noção. No estúdio, o pivot, reparando nas centenas de mulheres por todo o parque, perguntou ao colega. - George, tens já, com certeza, uma ideia do que farão aí todas essas grávidas?!... - Claro, Sam. O Tom, o garoto com quem falei, disse-me que todos os nascituros estão já magnetizados e que serão os homens do futuro. Quando nascerem, trarão ainda características do homem actual, mas a mente e o espírito serão completamente moldados pela Lei do Amor, tal como a conhecemos hoje. Essa magnetização, por outro lado, estende-se também às mães e, a partir de hoje - repara que nós nem sequer sabemos como será o amanhã...- essas mulheres serão o principal motor de transformação do mundo... Jonh, enquanto via as notícias e as comentava minimamente, lembrava-se de Susan e dos filhos. Ocorriam-lhe uma data de perguntas que faria se estivesse na situação do tal George em Atlanta, quando recebeu indicações de que Eve estaria em condições de entrar em directo. - Jonh?!, estás a ouvir-me? - Sim Eve. O que temos por aí em Fairhavens? - disse, algo ansioso. - Em primeiro lugar, parabéns, a tua mulher está grávida, se é que ainda não o sabias!... E este teu filho será um bebé do futuro. Desculpa dar-te a notícia em directo, mas ninguém sabe como será o dito futuro. Por isso, não posso perder um segundo. Quanto ao das crianças, ele parece estar assegurado... Jonh esqueceu-se de onde estava e soltou um ah! de espanto, ao mesmo tempo que dava um salto na cadeira. - O quê? A Susan grávida? Como é que sabes? - Segundo me disse, quando tentava levar os garotos para dentro de casa, foi energizada pelo mesmo extraterrestre que se encarregou dos teus filhos. Já falei com os dois e as novidades não são tão aterradoras como inicialmente pensámos. Mas é melhor falares com a Bethy, que está com o superterreano nº 22/22, o comandante máximo da invasão na zona de New Bedford. Pelos vistos, pensou Jonh, os superterreanos, não tinham nomes. Pelo número da criatura, deviam identificar-se todos como uma potência energética elevada a um certo exponente, como os terráqueos faziam com a matemática. Mas deixava-o apreensivo a familiaridade da Susan e dos filhos, enquanto ele, obrigado pelo judeu sefardita, permanecia longe dos acontecimentos, sujeito apenas às imagens das câmaras e às perguntas que a Eve certamente não lhe ocorreria fazer, sem ter visto no entanto os milhares de naves necessárias para invadirem o planeta. E foi, antes de mais, isso que perguntou a Eve. - E as naves, onde é que andam? - Boa pergunta para um habitante da terra habituado a ver metralhadoras, bulldozers, mísseis e por aí adiante. Segundo a Bethy, a tua filha, a porta-voz dos invasores aqui na cidade, há-as por todo o lado, no chão e no ar. Só que estão, como dizer, minimizadas, ou zipadas, não sei que termos utilizar. Apenas me ocorre utilizar a linguagem que usamos no nosso contexto informático. Aqueles pirilampos que vimos logo à saída do estúdio são naves. E os superterreanos andam por aí aos milhares, igualmente minimizados e quase invisíveis. Eles têm a capacidade de compactar tudo, até as coisas ficarem reduzidas a vários tamanhos, mas todos pequeníssimos, quase atómicos. - Esta pergunta é difícil, dadas as circunstâncias Eve - retorquiu Jonh - mas diz-me, muito rapidamente, como estão a Susan e os garotos? Daqui a pouco temos o Presidente dos Estados Unidos a fazer uma comunicação. Já há relatos das televisões do mundo inteiro a falar da magnetização das crianças e das grávidas. Também já vi como eles fazem isso. Tanto quanto sei, é pelo contacto da pele e com os olhos. Na RTP, em Portugal, na região de Aveiro, de onde é originário o meu avô aqui de New Bedford, mostraram isso com muita minúcia. Viu-se um superterreano a energizar uma menina com Síndrome de Jacobsom e ela parece ter ficado muito melhor, com uma inteligência e desenvolvimento que até aí não demonstrara. - É verdade. Já ouvi várias opiniões acerca dos superterreanos e das suas capacidades de cura. O que nos leva a pensar que poderão ser seres superiores. Gostava de poder entrevistar algum, mas é impossível. Só através das crianças e das grávidas energizadas. Por outro lado, segundo a tua filha, eles têm uma forte hierarquia. - Bom, se a Susan e os miúdos estão bem, vou ver os faxes da redacção. Pode haver algo de novo - disse Jonh, enquanto digeria tanta informação e ao mesmo tempo tão pouca. Susan estava grávida, ambos iriam ser pais de um homem ou de uma mulher do futuro. Esquecera-se de perguntar o sexo da criança, se tinha boca, nariz ouvidos e todas as coisas necessárias para se viver no único planeta que conheciam, a Terra. Pelos vistos, a acção dos superterreanos era toda virada para as mulheres grávidas e para as crianças, e o que decorria das primeiras impressões era que o futuro da gente adulta, se não estivesse comprometido definitivamente, ao menos iria levar grande reviravolta. Poderia ele ainda ser um dia velhinho, avô, e neste caso de que netos?! Sintonizou de novo a CNN. Desta vez a transmissão era a partir de Washington, relativamente perto da Casa Branca e, finalmente, conseguia ver-se um superterreano. Talvez fosse um superterreano importante e o melhor era ouvi-lo. Parecia dos poucos capazes de comunicar em língua que não fosse apenas o roçar na pele de criancinhas e grávidas para as converter em matéria e espírito supertérricos. Falava um inglês entrecortado por gestos e, dos da série 22/22, era o 22/4. Era uma criatura com grandes olhos, longos braços e, pelas medidas terrenas, devia ter talvez um metro e sessenta e cinco. Era transparente e, no interior do corpo, viam-se órgãos semelhantes aos dos humanos, veias azuladas e sangue vermelho, que corria dentro delas a uma velocidade espantosa. O repórter que o entrevistava olhava para aquela criatura estranha espantado e, depois de fazer perante a criatura o ponto da situação, ocorreu-lhe perguntar perante as câmaras de que planeta do universo eram oriundos. - Somos do Superter - respondeu.. Depois, com um sorriso enigmático, disse que a gente dele desde sempre andara “ cá por baixo”... Tinha uma voz calma e serena que parecia sair-lhe directamente da cabeça e do pensamento, uma cabeça e um rosto bastante parecidos com os dos humanos, mas onde faltavam decisivamente orifícios. O nariz e a boca estavam lá, os ouvidos também, mas sem qualquer utilidade, uma vez que tudo nele agia com o impulso dos pensamentos. E à medida que “falava” emitia ondas magnéticas, rapidamente compreensíveis pelo entrevistador, a quem entretanto e sem que este desse conta, tocara com as mãos na nuca. - Não sei se sabe, mas você já está magnetizado e, por isso apto, a compreender a linguagem dos superterreanos, Senhor Michael. Escolhi falar consigo porque é um terreno puro, de mente aberta para aceitar o desconhecido. É o que acontecerá aos milhões de homens e mulheres como você, por toda a Terra, os escolhidos para a libertarem dos males que uma grande parte de vós lhe criou... Ao dizer isto, o 22/4, calou-se e pôs-se a meditar durante uns bons segundos, enquanto Michael, de microfone em punho, prosseguia: - Caros telespectadores do planeta, de todo em todo, não resistam à magnetização. É por via dela que compreenderão o Universo e todas as maravilhas de Deus. É uma sensação maravilhosa esta de perceber que os superterreanos foram os primeiros habitantes da Terra, expulsos dela depois por terem levado a cabo acções impróprias que quase a destruíram, como agora. Foram para o Infreino, um planeta de depuração, onde foram estratificados em várias camadas, entre os melhores e os piores. Alguns, depois de limpos e melhorados pelo Criador, voltaram para a Terra, com o aspecto que hoje temos, quando Deus julgou que estávamos prontos para viver no paraíso. A nossa origem é, pois, extraterrestre. Muitos, das várias camadas, voltaram esporadicamente em acções de pesquisa e experimentação para que surja uma nova raça de terráqueos, no caso de a raça humana falhar, como é o nosso caso... Se repararem bem nos fetos abortados com poucas semanas, vêem que eles têm mais ou menos a forma dos extraterrestres avistados em muitas partes do mundo. Sobretudo aqui nos Estados Unidos. Enquanto o repórter dizia todas aquelas coisas como se tivesse sido iluminado por uma sabedoria divina ilimitada, as luzes dos superterreanos prosseguiam a cruzada de magnetização dos homens e das mulheres ali presentes, depois de as crianças e as grávidas de todo o planeta o terem sido em primeiro lugar. De repente, perto de Michael, um homem branco, de cabelo cortado à escovinha, lançou no ar um grito de ordem, enquanto dizia: - Cambada de imbecis! E vão deixar que estes frascos de vidro tomem conta do mundo? Onde é que está o exército e o poder da América?! Que presidente escolheram os americanos para lhe guiar os destinos? Ao dizer isto, o homem, de dentro do casaco de couro onde estava dissimulada, sacou de uma metralhadora, fazendo pontaria ao 22/4, enquanto se preparava para disparar. Entretanto, o superterreano emitiu na direcção do homem um potente feixe de luz, que o minimizou até ao zero. A seguir, fez-se de novo silêncio, após o barulho motivado por alguns homens e mulheres adeptos do cabeça rapada, minimizados quase simultaneamente. Michael prosseguiu: - Como vêem, não adianta intentar qualquer acção contra os nossos salvadores. Do que pude saber após a minha magnetização, tudo o que nós ser humanos construímos com elementos tirados à Terra, como, por exemplo, com o petróleo, até ao clarear do dia será compactado. Acontecerá como ao dissidente aqui presente e aos outros reaccionários como ele. Mas agora tenho de terminar este directo. O Presidente Obama vai fazer um comunicado à América. Jonh, depois de ouvir o colega da CNN, constatou nada mais haver a fazer senão esperar. Depois do apelo à não resistência, o melhor seria não pensar numa vida futura sem o conforto de um banho de manhã, com água aquecida pelo painel solar de sua casa. Pelos vistos, não haveria casas, nem pontes, nem nada e, se muito bem calhasse, os humanos voltariam a andar nus como no princípio ou, então, com uma pequena parra a cobrir-lhes as partes púbicas, pensou, com algum pudor. O melhor seria então que os superterreanos modificassem também o clima da Terra e o livrassem do frio do Árctico, do Antárctico e por aí adiante. Quanto ao novo filho, estava um bocado apreensivo. Nasceria igual a um superterreano, ou seria mais idêntico aos humanos, apenas com a mente preparada para viver e espalhar por todo o lado a tal Lei do Amor? Da família, era o único ainda intocado, não fora magnetizado e continuava com as mesmas angústias de todos quantos não tivessem tido o tacto da pele com os viajantes do espaço. - Será que, a partir de amanhã, com o planeta virgem como antes de haver nele um único homem, iria a humanidade alimentar-se do maná do paraíso quando a serpente tentou Eve pela primeira vez? - pensava Jonh. Lembrou-se da colega, em casa dele, com Susan e os dois filhos. Teria ela e os câmara mans já sido magnetizados? A janela do estúdio estava fechada, com os estores corridos e Jonh não resistiu a abri-la. Precisava de contemplar de novo o espaço lá fora, onde os superterreanos, aos milhares, zipados e do tamanho de pirilampos, deixavam New Bedford como uma cidade em festa e a viver permanentemente debaixo daquele imenso fogo de artifício. Gostava de ver ao menos uma nave no seu tamanho natural, mas a dissimulação parecia ser a melhor arma da invasão. Ver igualmente um superterreano, seria também uma forma de acreditar nos acontecimentos que ainda lhe pareciam impossíveis. Enfim, a Terra ia ter um novo destino e o destino tem sempre cravado nas pontas a inquestionável força de Deus. Jonh cerrou os olhos por momentos, enquanto esperava pela comunicação do presidente. Quando os abriu, ao seu lado estava um homem de cristal e ele soube de imediato que já não era o mesmo Jonh de antigamente. Naqueles breves segundos adquirira uma aguda percepção das coisas e nem a criatura a seu lado, o 22/5, da série destacada para a América, lhe causava qualquer estranheza. Sentia-se vibrante de entusiasmo, por ele e pela família. Sobretudo pelo filho que iria nascer, sabia agora, uma menina linda, cheia de amor, em tudo igual à irmã, uma menina Cristal cheia de encanto e sabedoria. Ao ser tocado pelo 22/5, fora como que escolhido e abençoado, depois da inconfidência do superterreano. Os extraterrestres sempre se tinham sentido horrivelmente feios e, durante as várias invasões dos habitantes do Infreino, nas suas múltiplas camadas em depuração, tinham feito inúmeras experiências com os humanos, até chegarem a uma criatura fisicamente tão bonita e perfeita como nós. Sim, inicialmente fora a inveja do nosso aspecto a motivá-los nas incursões e experiências, mas Deus pôs um travão nisso e obrigou-os a dominarem-se, sob pena de os zipar para sempre e de os mandar para um planeta a milhões e milhões de anos luz da Terra e onde só ainda havia centopeias, de que eles tinham particularmente medo, apesar de todos os seus poderes de ziparem e manipularem a matéria. Eve estava a chamá-lo, enquanto se preparava para deixar a família de Jonh e procurar um novo motivo de reportagem. - Jonh, passo-te a emissão. Daqui é tudo. Como vez, toda a gente está feliz e não há razões para receios. - Obrigado, Eve. Vamos então ver o que o Presidente Obama tem para nos dizer. Senhores telespectadores, são 3H da madrugada, seguem as imagens da CNN. – prosseguiu Jonh. A emissão prosseguiu com imagens de Washington e Jonh, sem qualquer espanto, viu o presidente nu, sem se sentir chocado com isso. A América deixara finalmente de ser puritana e, naquelas imagens, pode ver-se a pureza de um homem que nascera para ver a transformação do mundo num lugar onde era bom viver, sem poluição, sem maldade, nem inveja, nem dor, nem ódio. Agora tudo era amor. - Caros cidadãos, Viva o Mundo, Viva a América. Estamos a viver um momento decisivo para a humanidade, como todos já devem saber. Alguns, os cépticos, estarão ainda incrédulos e, por isso, antes de mais, faço daqui um apelo para todos se deixarem tocar pela nova Lei do Amor de que são mensageiros os superterreanos. Já todos os presidentes dos 203 países da Terra foram magnetizados e dão neste momento orientações aos cidadãos para não tentarem a revolta. Pensa-se que, apesar de tudo, haverá ainda muitos a resistir à Lei do Amor. E, já para não falar nos grandes criminosos encarcerados nas cadeias, sobretudo os banqueiros, as bolsitas, os agiotas e os que veneram o dinheiro acima de qualquer outra coisa, são os grandes condenados à zipagem. A sociedade de amanhã não voltará a deixar-se ensombrar por esses malefícios. E eu, caros americanos, queridos compatriotas, fui escolhido para estar no sítio certo e no momento certo desta maravilhosa transformação. As minhas filhas, os nossos filhos, serão finalmente criaturas de Deus, a viver em harmonia com a Sua lei num mundo onde não haverá diferença de raças, de credos e onde o dinheiro jamais nos voltará a escravizar. A imagem do presidente deixou por momentos de aparecer no ecrã, enquanto surgiam reportagens em catadupa dos países de tudo o mundo, desde os Urais até á Austrália. E, entre elas, houve uma que captou particularmente a atenção de Jonh. Estava a falar um pescador de Aveiro, a terra do seu bisavô, em Portugal, que, finalmente, não lamentava a extinção do bacalhau na Terra Nova e a morte dos pesqueiros do porto, de onde saiu tanto sonho para depois morrer nas águas daquele mar longínquo em que a pesca desenfreada levara à extinção do bacalhau. Felizmente, dizia o homem já magnetizado e impregnado pela nova ordem das coisas, Deus daria à humanidade o maná que ela tinha recusado num acto rebelde, quando Eva levou a Adão a roubar da árvore onde estava tranquilo o conhecimento, surripiando algum para o pôr ao serviço da ciência que, em muitas coisas, quase tinha matado o planeta. De novo, no ecrã, apareceu Barak Obama, com a última recomendação. - Como combinei com o superterreano 22/4, aqui ao meu lado, transparente como cristal, antes de o mundo artificial ser todo zipado, vamos assistir ao processo inverso. Simultaneamente, em todo o planeta, vão aparecer, na sua primeira dimensão, os milhões de naves utilizadas para esta invasão programada por Deus desde os templos da criação do mundo, ao oitavo dia, quando a semana tinha oito. Eu estou aqui nu, simbolizando a Terra quando foi concebida, e também para dar o exemplo de que devemos viver de hoje em diante, sem ambição e sem vaidades de qualquer espécie. Nos céus, os milhares de pontos minúsculos, a uma ordem do superterreano 22/4, instantaneamente ficaram do tamanho com que durante milhões de anos os extraterrestres tinham visitado o planeta. Mas, dentro, estavam extraterrestres bonitos e auto transformados em homens e mulheres como a raça humana, das mesmas cores existente na Terra até então, unidos e em paz. - Jonh, acorda! Estás gelado! Esta mania de dormires sem pijama ainda te vai arranjar algum trinta e um nos pulmões!... Jonh virou-se na cama ao lado de Susan e beijou-a na boca, enquanto lhe sussurrava ao ouvido e lhe mordiscava a orelha. - Susan, querida!, vamos fazer amor... - FIM -